segunda-feira, 4 de abril de 2011

Iron Maiden Recife 2011 - The Final Frontier World Tour

Como todo espetáculo de banda grande, a brincadeira começou pontualmente às 20h. Sem essa de fazer público esperar horas para encontrar os ídolos. Doctor doctor, do UFO, banda inglesa que influenciou o Maiden e tocou no Recife ano passado, era a senha para deixar a plateia mais acesa do que nunca. A música vai acabando e as luzes se apagam. Os dois supertelões ao lado do palco, de 15 metros de altura, mostram uma batalha espacial, tendo o mascote Eddie como personagem principal. É uma referência ao título do álbum The final frontier, lançado em 2010 e que está sendo divulgado na The final frontier world tour. A canção de entrada tem duas partes distintas. A primeira, Satelite 15, é tocada nos altos falantes. A batida tribal e as guitarras dissonantes são cortadas pelo voz de Bruce, que tem o rosto projetado nos telões. Os outros cinco caras vão entrando no palco e é dada a largada. The final frontier, um hard rock pegajoso, faz a galera cantar junto. Nessa hora, quem tinha alguma dúvida perdeu o medo de que algo desse errado e o show não decolasse. O Maiden estava de novo no Recife, pouco mais de um ano depois da primeira apresentação, na Somewhre back in time tour, de 2009, no Jóquei Clube, na Zona Oeste da capital.

Ao contrário do concerto anterior, o show desse domingo trouxe canções novas. Cinco, no total. Além da primeira, foram apresentados bons momentos do álbum de 2010. El dorado, o primeiro single, tem uma levada legal e solos bem encaixados de Dave Murray e Adrian Smith, sem dúvida um das grandes duplas de guitarristas do metal mundial. Bruce arriscou o primeiro grito de guerra para sacudir a plateia: "Scream for me... Recife!" Um cara subiu no palco, mas foi rapidamente retirado, sem nenhum drama. Depois veio o primeiro clássico da noite: Two minute to midnight, aquela cantarolada pela garota Maria Catarina. De longe, dava para ver os celulares apontados para o palco. Todo mundo filmando, gravando ou tirando foto de recordação.

The Talisman, uma canção grande do álbum novo, deixa parado quem não conhece bem o disco. Tem uma letra enorme e um refrão que não pega. É uma aposta da banda, que reverencia o trabalho do terceiro guitarrista, Janick Gers, ao violão, na introdução. Em Coming home, Bruce explica a ideia da música e fala como é rodar pelo mundo para tocar e viajar no Ed Force One, o Boeing usado pelo Maiden para girar pelo planeta. Só no Brasil foram seis cidades visitadas. Murray e Smith brindam os fãs com belíssimos solos, numa semibalada inspirada.

Em seguida, Dance of death, do CD de mesmo nome, lançado em 2003. Bruce até errou um pedacinho da enorme letra, que aborda rituais macabros, e se desculpou. A banda manteve o pique, como se nada tivesse dado errado, e tocou todas as partes de uma canção cheia de detalhes. O cenário trazia a capa do álbum, assim como no resto do repertório, mostrava um desenho diferente. Sempre fazendo referência ao CD da música que estava sendo executada e a parte gráfica da época. Perto da enorme bateria de Nicko McBrain era possível observar duas torres de foguetes e na plataforma do kit de percussão a inscrição Satelite 15.

Ornamentação nem sempre percebida, sobretudo, para quem fica longe. E também para quem não consegue tirar os olhos de Bruce. Em The trooper, superclássico de 1983, o cara corre, canta, sobe nos alto falantes de retorno e tremula a bandeira do Reino Unido. Uma paulada para alegria dos mais antigos. The wicker man, do Brave new world (2000) vem quase emendada e põe a galera para cantar também. Essa fisga os fãs da atual fase, com três guitarristas. “Your time is come...”. E, para dar uma brecada no ritmo, Bruce dedica Blood brothers aos irmãos de sangue do Japão, devastado por terremoto e tsunami. Grande momento. E que solo de Janick.

O show seguia e a apresentação das canções novas chegava ao fim com When the wild wind blows. Onze minutos, um riff hipnótico e uma música candidata a novo clássico. Nessa altura, o jogo já estava no papo e se preparava para dar olé. É covardia. The evil that man do, de 1988, e Fear of the dark, de 1992, é para se esgoelar. Essa última serve, inclusive, para tirar qualquer dúvida sobre paixão dos fãs pelo Maiden. Todas as notas são entoadas com os músicos. Os solos, as melodias e os duetos. Momento único de uma relação entre ídolos e seguidores, poucas vezes vista no rock’n roll.

O show ia terminando e vinha a pergunta; Cadê Eddie? O mascote apareceu na tradicional Iron Maiden. Caracterizado como um ser de outro planeta, o boneco gigante e articulado duela com Janick e tira o fôlego de velhos e crianças. Depois de prometer que vai pegar não importa o lugar, o Maiden dá uma pausa e volta para o bis. Outra covardia. The number of the beast e Hallowed be thy name, de 1982, trazem a velha parceria Donzela-fãs. A galera canta tudo: introdução, narração, solo e coro. Quando cidadão já está rouco e pensa que acabou, vem Running free, do primeiro álbum, de 1980. Bruce aproveita e apresenta os parceiros, com destaque para a reverência ao líder e chefão Steve Harris. Brinca com Adrian e faz piada com a guitarra, uma Gibson Les Paul, que o músíco carrega para todos os lugares há décadas. O vocalista atira o gorro para o público e volta para encerrar uma grande festa do metal.

Uma aula de profissionalismo e talento. Exemplo de como se manter uma máquina gigante a todo vapor. Uma noite para ficar grudada na cabeça da menina Maria Catarina, aquela que nem parecia ter 8 anos quando cantava Two minutes to midnight e filmava tudo com os olhos arregalados. Um momento marcante para o pai dela e para tantos outros jovens, velhos, adolescentes, pretos, brancos, da área VIP ou da galera. Gente que pode dizer e estampar na camiseta, como orgulho: Iron Maiden no Recife.... Eu fui!

> Pode ser branco ou preto. Ter passado dos 40 anos ou sequer completado 10. Tanto faz se for do Recife ou de outra capital nordestina. Ou ainda melhor, se nasceu no interior. Ninguém liga foi para área VIP ou ficou espremido na galera. E aqueles também que ficaram do lado de fora. Só escutando. Tem coisas que só um show do Iron Maiden pode proporcionar. Cenas inimagináveis surgem do nada e deixam muita gente de queixo caído. Pendurada nos ombros do pai, o engenheiro Luiz Gonzaga Gadelha Junior, Maria Catarina Gadelha, 8 anos, despontava na multidão, no meio da pista premium, reservada para quem pagou R$ 300 e assistiu, com mais conforto, ao show dos ingleses, na noite desse domingo, na área externa do Centro de Convenções, em Olinda, Região Metropolitana.

Maria Catarina estava estreando num concerto de rock e mostrava que tem muito futuro como fã do gênero mais pesado de música. De camiseta rosa, com um celular nas mãos, não desgrudava os olhos do palco. Filmava e fotografava. Para quem estava do lado, sorria e demonstrava intimidade com o repertório do grupo, anos antes de ela pensar em existir. Para orgulho do pai-coruja, cantarolava baixinho: “two minutes to midnight...” e para quem ainda tinha dúvidas da paixão da headbanger precoce, Luiz avisava: “Desde os 5, ela gosta de Iron Maiden. Já toca baixo e arrisca umas coisas.”

A relação pai-filha-banda, demonstrada pelos dois fãs, mostra como o público do Iron Maiden é especial. Quem já passou dos 40 ouvia no velho e bom vinil. Para a criançada da idade de Maria Catarina, o velho bolachão é peça de museu. Para que um negócio tão estranho, preto com um buraco no meio e poucas músicas? É bem melhor Ipod, Ipad, MP3 e MP4 e internet, com Facebook. Os tempos mudaram, mas a banda está lá. Mais de 30 anos, 85 milhões de discos vendidos e muitos clássicos para tocar. Não importa a época ou a fase em que o admirador conheceu a Donzela de Ferro. Basta ver a quantidade de ônibus, carros e vans estacionadas perto do Centro de Convenções. As placas: João Pessoa, Maceió, Fortaleza, Natal, Carpina e uma infinidade de lugares. Tudo para conferir The final frontier world tour, que passou por seis cidades brasileiras, divulgando o disco de mesmo nome, lançado em 2010.

Para quem saiu de casa ou pegou estrada para ver Steve Harris, Bruce Dickinson e companhia foi uma noite sem grandes sustos. Quando dependia exclusivamente da produção, a cargo da Raio Lazer, nada a reclamar. Entrada bem sinalizada, banheiros em bom número (na área VIP), portões abertos cedo e sem filas, além de facilidade para tomar cerveja (um preço até camarada, levando-se em conta a qualidade do produto).

Masm quando o assunto é do poder público, o negócio complica. A Avenida Agamenon Magalhães, perto do Memorial Arcoverde, estava escura. Parecia mais uma boate. Os ambulantes fizeram a festa e ninguém organizava a área no entorno. O trânsito ficou sob a responsabilidade da Polícia Militar, que teve alguma dificuldade para fazer o tráfego fluir, sobretudo, por causa do desrespeito de muitos motoristas. Foi preciso guinchar carro parado no local errado.

Bronca mesmo é com o Centro de Convenções. Às 17h30, o estacionamento interno estaria lotado. Isso foi o que disseram funcionários, mesmo com as vagas sobrando podendo ser observadas facilmente. Uns até arriscava pedir uma tal carteirinha de acesso. Só não informavam qual documento era preciso mostrar. O jeito foi morrer com R$ 10 na mão do flanelinha e torcer para não ter o carro levado pelos ladrões.

Tirando as mazelas, o público de quase 10 mil pessoas, não teve do que se queixar. Pouco depois das 18h40, o Terra Prima, prata da casa, entrou no palco para fazer o esquente da galera. Daniel Pinho, vocalista que se apresentou no último show do Iron Maiden Cover do Recife, comandou a banda. Ele mostrou músicas do And life begins, primeiro disco do grupo, e enfrentou problemas típicos de quem abre para megabandas: som baixo e equalização de gosto duvidoso, principalmente, na batera. Mas nada que tirasse o brilho. Para finalizar, Enter Sandman, do Metallica. Assim não tinha como Luiz e a pequena Maria Catarina ficarem fora do clima para o encontro com os ídolos logo em seguida.

por Ricardo Novelino

Fonte: JC Online