Um carro bonito, possante e seguramente caro (só não me pergunte que carro era porque não entendo nada disso) dá voltas em círculos em alta velocidade num descampado. Várias voltas. Pára e de dentro sai Johnny Marco, personagem vivido por Stephen Dorff, com cara de tédio. Corta. O mesmo Dorff está agora deitado na cama de um quarto de hotel, ainda com cara de tédio, mesmo diante de um espetáculo de pole dance protagonizado por duas gêmeas loiras deliciosas ao som de “My Hero”, do Foo Fighters. Corta. Mais cara de tédio, mais imagens do dia-a-dia de uma estrela de Hollywood em crise existencial. Corta, corta e corta.
O novo filme de Sofia Coppola, “Somewhere – um lugar qualquer”, é basicamente isso. Deve ter a ver com a trajetória pessoal dela mesma essa fixação por retratar celebridades entediadas em busca de um sentido para a vida à qual ela se dedicou em suas três últimas realizações para o cinema. No caso de Johnny Marco, esta busca poderia muito bem se encerrar caso ele dedicasse mais atenção à sua filha pré-adolescente, que o visita esporadicamente. Mas para isso ele teria que abdicar, pelo menos em parte, de sua rotina de superstar mimado, algo que, parece, ele não consegue fazer, mesmo que visivelmente não veja mais muita graça na coisa como um todo.
O filme é bom ? Mais ou menos. Mais pra menos. É muito bem dirigido e interpretado, e tem situações divertidas, como a do massagista que precisa “entrar no clima” do cliente para realizar suas tarefas. Mas no geral é chato e tedioso. Propositalmente, é claro, já que se propõe a retratar o dia-a-dia de uma pessoa chateada e entediada.
Já não botava muita fé no filme, pois pelo que tinha lido a respeito dava pra notar que ele seguia a linha de “Encontros e Desencontros”, espécie de “clássico Cult” no qual eu não vi, sinceramente, a menor graça. O que mais me surpreendeu, na verdade, foi a lotação da maior sala do Cinemark do shopping jardins naquela noite em que aconteceriam também apresentações das bandas Eddie, de Olinda, e Mamutes, local. Era uma espécie de ensaio para uma possível ressurreição da Sessão Notívagos, série de shows musicais acompanhados de exibições de filmes que acontecia regularmente até meados do ano passado. Se dependesse unicamente da presença do público e da perfomance das bandas escaladas, estaria tudo perfeito – mas não, não dependia.
Carnaval no inferno: O ar-condicionado do saguão do cinema, onde aconteceriam os shows, estava quebrado! Isso, somado à insistência das pessoas em fumar num recinto fechado, criou um ambiente bastante desagradável. Mais desagradável ainda para os que se arriscavam a entrar na enorme fila para comprar uma cerveja a 4,00. Detalhe: não eram vendidos tickets, ou seja, quem quisesse tomar outra cerveja, teria que entrar na fila novamente, segundo me foi relatado pelos que bebem (eu não bebo). Pelo menos a marca era boa. O calor, devo dizer, nem era tanto, muito embora o ar-condicionado tenha feito falta, sem sombra de dúvidas. Desconfortável porém não insuportável. O problema maior para mim, asmático e fumante passivo involuntário, era mesmo o desagradável cheiro de fumaça de cigarro no ar. Veja bem: defendo o direito dos fumantes fumarem, mas enquanto não inventarem um dispositivo, algo como uma redoma de vidro para as pessoas colocariam na cabeça que mantenha a fumaça que produzem exclusivamente para si, acho que tenho o direito de reclamar. E quem achar ruim, “pegue o gato e se azuin”, já dizia a minha vó.
Mas vamos ao show. Som fraquinho – mal sinal. Fabio Trummer fala no microfone que aquele era o primeiro contato da banda com a aparelhagem, já que não tiveram tempo de passar o som, e pergunta ao povo se tava legal. O povo responde que sim, mas eu diria que não. Vai ver eu sou chato, né ? E olha que eu nem entendo dessas coisas, tecnicamente falando. Só sei que, aos meus ouvidos, a voz tava baixa e abafada e a guitarra praticamente inaudível. Mas a banda é boa, muito boa, e foi aos poucos criando um clima propício à celebração. Um verdadeiro desfile de “hits” alternativos logo de cara, com “Desequilibrio”, “lealdade” e “me diga o que não foi legal”, dentre outras. Aos poucos vão se acertando os ponteiros e pronto: está criada a alquimia, na base de um suingue “roqueiro” tipicamente brasileiro com um sotaque que só o Eddie é capaz de produzir. Uma banda com excepecional personalidade que seduz inclusive não-adeptos do tal “samba-rock”, como eu. Até porque o Eddie é muito mais que “samba-rock”: é rock, é pop, é frevo, é o diabo! Rock legitimamente brasileiro. "Nunca fomos tão brasileiros", eu diria ...
Os papos descontraídos entre os membros da banda, notadamente Fabio e “Urêia”, o percussionista, ajudaram a criar o clima de festa e descontração. Fabio é um grande frontman, ao seu estilo, sem grandes arroubos estelares, contido porém sincero e desencanando. Fala de times pernambucanos, saúda a todos, inclusive aos que vendem a cerveja cara, e saúda o Lacertae, que segundo ele tinha as melhores músicas da lendária coletânea “Brasil compacto”, dos anos 90, da qual também fizeram parte. Lembrou disso, provavelmente, devido à presença, no público, de Deon, guitarrista e vocalista do grupo sergipano. Até dei uma instigada para que ele fosse até lá dar uma canja, mas sem sucesso.
O show prossegue, com a banda afiada e o público na mão. Tocam, inclusive, a primeira música de seu primeiro disco, “videogamesongs”, do Sonic Mambo. Um clássico – mas esta é uma que precisava de um som de guitarra mais potente, algo que, infelizmente, não tivemos. Poderia ter sido O ponto alto da noite, mas não foi. O ponto alto foi uma espécie de pout-pourri de musicas de carnaval e Hinos de blocos de frevo de Olinda, puxados pelo do “segura a coisa” e emendado com o do “segura o cu”, onde Fabio faz todos se agacharem (tava com uma preguiça da porra, mas entrei no clima também, claro) e se levantarem ao fim de uma rima que terminava na singela frase “segura o cu senão eu meto o dedo”. Muito bom. Já o ponto fraco foi um cover esquisto que me disseram que era do Beirute – não sei, não conheço.
E foi isso. Uma hora e meia, aproximadamente, de show, e um abraço. Ainda fiquei mais uns bons 20 e tantos minutos esperando pelos Mamutes, mas quando vi eles finalmente chegando ao palco e notei que ainda teriam que montar um monte de coisas, inclusive a bateria, desisti e fui embora. Uma pena, já que não vi ainda a nova baterista em ação num show ao vivo, apenas na gravação de um especial acústico que será veiculado pela TV Aperipê - no qual ela mandou bem, por sinal.
Saldo pra lá de positivo, apesar dos pesares.
Fotos: Rafa Aragao, Divulgação e Snapic
Texto: Adelvan
quinta-feira, 19 de maio de 2011
Entrevista com plastique noir
Faz tempo que não leio mais revistas de Heavy Metal (já fui assinante da Rock Brigade, nos anos oitenta), mas sempre folheio nas bancas. Numa destas investidas, vi que a Roadie Crew estava lançando uma coletânea virtual dedicada ao gótico/dark brasileiro. Legal, nem sabia que existia uma cena gótica no Brasil, para além do “gothic metal”, geralmente chato e repetitivo. Baixei o disco e uma banda, em especial, me chamou a atenção: plastique noir, de Fortaleza, Ceará. Em termos estritamente estilísticos não traziam nada de novo – era um som derivativo que emulava tudo o que de melhor foi feito na área nos anos de 1980, especialmente - mas se destacavam pela competência na composição e na execução da música presente na coletânea, “Those Who walk by the night”. Fui atrás de mais material da banda e confirmei minha primeira impressão: havia realmente algo de especial ali. Tornei-me fã ao ponto de viajar para vê-los, em Recife, no Abril pro rock, e em Salvador. São também muito bons Ao Vivo, tanto que estão conseguindo furar o bloqueio que os deixava naturalmente confinados ao gueto e tocando em vários festivais alternativos Brasil afora, alguns bastante conceituados, como o próprio Abril pro rock.
O plastique noir acaba de lançar seu segundo disco, “Affects”*, o que me fez pensar que era o momento oportuno para uma entrevista com os caras. O resultado, respondido por Airton S., o vocalista, você confere logo abaixo ...
· * “Affects”, o novo disco do plastique noir, é mais homogêneo e mais bem gravado que o anterior, “Dead pop”, de 2008. O baixo “cavucadão” de Daniel e as linhas de guitarra cortantes (com um pouco de peso e distorção em alguns momentos, inclusive) de Marcio Mazela, somados às programações precisas e o vocal soturno de Airton S., passeiam por composições bem acabadas feitas por encomenda para animar “festas estranhas com gente esquisita”. Os teclados, gravados por convidados, também se destacam, criando belos climas em praticamente todas as faixas. Não há nenhum grande destaque: o disco começa muito bem, com a bela “Rose of Flesh And Blood”, e segue no mesmo nível até o fim, oscilando entre passagens abertamente sombrias, embora quase sempre dançantes, e o escracho de letras como a de “Mazela takes a walk”, que foca o comportamento excêntrico de seu já legendário guitarrista.
Grande disco.
por Adelvan
* * *
Airton S – A questão é que o Plastique Noir nasceu como som de gueto e, até certo ponto, exatamente para ser som de gueto. A gente tem tentado se desvincular disso pra que a coisa não fique chata demais de ser feita, isso pra nós mesmos. Eu, Mäzela e Danyel escutamos som pra caralho, que vai desde Aldo Sena até black metal. No começo formamos a banda para que ela fosse estritamente gótica, mas hoje a gente percebe que esse coisa negra da música está presente em vários estilos e sempre foi nosso playground preferido. Dá pra encontrar referências interessantes no drama do tango, no samba escapista do Cartola, no piano de Beethoven e por aí vai. Se isso vai forçar uma identificação de nosso som com o público gótico, melhor! É uma massa numerosa, isso nos proporciona contatos e principalmente amigos. Quando a gente chega em São Paulo e Brasília, pra citar duas cidades em que tocamos com frequência, já saimos do avião direto para caírmos na palhaçada com os amigos! Vamos tomar umas, pôr o papo em dia, farrear e rir bastante. Mas claro que é sempre bom dar atenção ao universo fora do gótico também, se quisermos que nosso som tenha sempre uma sobrevida. O que era só diversão a princípio está chegando a um patamar de trabalho que gera uma responsabilidade de que nosso som se apresente da maneira mais profissional possível. E, para que ele se mantenha assim, é importante que busquemos diálogo com outras cenas, outros palcos, outras opiniões. Acho que se trata tudo de um grande esforço de equilíbrio.
Programa de Rock – Por falar em gueto, é possível escapar dele mesmo se mantendo fiel a uma proposta específica, sem se render a “misturebas” oportunistas? Vocês se sentem parte de um “gueto”? Em caso de resposta positiva, sentem-se bem, aconchegados, dentro dele?
Airton S – Acho que o Plastique Noir é também música de gueto, mas não só isso. Em cidades como Fortaleza e Recife, é comum de se ver uma parte do público de nosso show que não está vestida de preto. É minoria, mas rola. Não temos problema com a palavra “gótico”, que dá nome ao gueto de que estamos falando. E o que temos percebido, principalmente com o novo álbum, é que até mesmo os góticos tem encarado de coração aberto algumas licenças estilísticas a que nos permitimos nesse trabalho mais recente.
Programa de Rock – Existe uma cena dark/gótica estruturada e atuante atualmente no Brasil? Se existe, qual o seu real tamanho, onde ela é mais forte, e como ela dialoga, se é que dialoga, com o cenário independente em geral?
Airton S – Existe e está em fase de maturação, talvez mais perto de um profissionalismo que nunca houve antes. Algumas cidades e regiões tem cenas mais fortes e profissionais, como é o caso de Salvador, Brasília e principalmente São Paulo, que tem uma agenda semanal repleta de eventos simultâneos. Semestralmente rola lá o Projeto Ferro Velho, que traz sempre um grande nome mundial do estilo com a abertura obrigatória de uma banda nacional, o que favorece um intercâmbio inestimável em termos promocionais e de troca de know-how entre países. Existe até mesmo um festival nacional, o Woodgothic, que já conta com três edições e é organizado por uma das bandas mais prestigiadas do Brasil hoje, o Escarlatina Obsessiva. Rola bianualmente no alto da serra mineira, em São Thomé das Letras. A DDK, no Rio, põe brincando umas 500 cabeças pra dento da festa. Nada disso existia até dez anos atrás e olha que as primeiras bandas e eventos góticos no país datam de meados dos anos 80. Ou seja, nos últimos anos tá rolando um “boom” bem grande. Tivemos sorte de iniciar nossas atividades no meio disso tudo. Ou talvez não tenha sido coincidência, talvez o momento tenha favorecido nossa banda e nossa cena assim com tantas outras, com a expansão da internet, barateamento da produção musical etc. Agora, diálogo com o independente fora do gótico, acho que praticamente inexiste. Algumas bandas do selo em que estamos agora, a Wave Records, tem obtido vaga nos festivais de maior renome, mas não é sempre que rola.
Programa de Rock – Senti no “Affects”, o novo disco do Plastique Noir, uma maior homogeneidade nas composições, ao contrário do primeiro disco que, como é de praxe em estréias de bandas que atuam já algum tempo no cenário, funcionou mais como um apanhado de músicas que vêm sendo buriladas ao longo do tempo. Como foi o processo de composição do disco, as musicas são todas novas ou houve alguma retomada de trabalhos antigos nunca antes lançados?
Airton S – É tudo novo. O único reaproveitamento foi a faixa-tributo, “Never Look For People Like Us”, que era do Max e resgatamos do fundo do baú pra homenageá-lo. Todas as novas foram surgindo aos poucos, entre um ensaio e outro durante a tour do Dead Pop que durou, ainda que fragmentadamente, uns três anos e rodou boa parte do país. De volta à Fortaleza, vimos que tínhamos composto quase 20 músicas ao final do processo, muito embora durante ele nós já tínhamos uma noção de qual ia entrar na track list final e qual não ia. Ok, até que ainda chegou a rolar uma discussão por essa ou aquela faixa, no sentido de incluir ou limar, mas tentamos formar um consenso e acho que deu certo. Foi interessante trabalhar dessa forma - refiro-me a essa coisa de “criar um disco do nada”. Eu nunca tinha feito isso e talvez tenha sido o que justamente trouxe a coesão que você percebeu. Agora, não sabemos muito bem o que fazer com as sobras. Tem umas coisas que eu particularmente acho bem legais ali. No começo dos contatos com nosso novo selo, até rolou uma pilha mútua de fazer uma versão de luxo com disco extra, mas isso ficou inviável porque nossa verba pra gravar tinha acabado e daí resolvemos garantir o álbum full que já tínhamos em mãos. Talvez essa versão deluxe possa sair ainda. Não sei. Agora ninguém está mais pensando muito nisso, estamos tentando promover o que já tem.
Programa de Rock – Vocês ainda compõem pensando num álbum fechado, com um conceito, mesmo que vago e flexível, amarrando as faixas, ou vão compondo ao longo do tempo e apenas juntam o resultado?
Airton S – Um pouco dos dois. É que, nisso de compor ao longo do tempo sem neuras, coincidentemente ou não as músicas acabaram se mostrando “entrosadas” entre si, por si próprias, sem que tivéssemos que forçar a barra conceitualmente. Digo, conceito havia, mas não deu quase nenhum trabalho perceber depois que o material obtido se encaixava quase completamente nele.
Programa de Rock – Ainda existe espaço para o conceito de álbum, uma coleção de musicas representativas de um momento de uma banda embaladas por uma capa, contracapa e encarte? O Plastique Noir acredita que este conceito vai sobreviver? Em caso positivo, como conseguem resistir à tentação da urgência de nossos tempos hiperconectados para não lançar as musicas aos pedaços na net antes do resultado final acabado?
Airton S – Veja bem, nossa média de idade na banda é de 29 anos, mais ou menos. Não somos tão jovens. Alcançamos o vinil, tínhamos centenas de K7 em casa, já rebobinamos muitas delas na base do giro de caneta (risos) e só agora estamos tendo contato com o MP3, que foi o grande culpado por essa fragmentação no consumo de música. Eu, Danyel e Mäzela ainda trazemos um pouco dessa “cultura de álbum” nos nossos perfis musicais. E por uma questão igualmente cronológica, boa parte da imprensa musical também, já que os mais novos no meio têm o quê, 20 e poucos anos? Esse pessoal ainda leva a sério o formato de álbum assim como nós e é por isso mesmo que não rola conosco essa ansiedade de liberar material de qualquer forma. Penso ainda que, como prensar disco continua sendo uma parada cara e trabalhosa, o fato de a banda ter encontrado alguém que faça isso por elas, leia-se selo, ou mesmo ela ter reunido recursos para fazer por si mesma, denota que atingiu um nível legal de profissionalismo e por isso merece atenção do mercado e dos fãs.
Programa de Rock – O suporte físico ainda é realmente necessário? Pensam em, algum dia, lançar seus trabalhos apenas via internet? Como vocês administram este equilíbrio entre uma coisa e outra, o novo e o velho estilo de se “vender” música? Há espaço para os dois?
Airton S – Por enquanto, sim. E talvez mais ainda no nosso caso, já que somos freqüentemente identificados com uma cultura urbana como a gótica. Gente assim tem seus próprios hábitos de consumo, seus fetiches e seu mercado simbólico interno. Assim como punks, straight-edges, bangers etc, os góticos ainda valorizam o item material colecionável. Agora, como já falei antes, tudo é uma questão de equilíbrio. Também não faz sentido nego ser anacrônico e fazer vista grossa pro ambiente virtual. Tanto é que nossas músicas também são comercializadas em formato de download. Pra não falar no vazamento pirata, que nós nem achamos tão danoso assim. Haja vista o nosso primeiro álbum, cuja permissão de lançar free foi exigida por nós junto ao nosso selo na época. Era nossa estréia, queríamos aparecer legal. Já no caso do Affects, não sentimos a necessidade de tentar forçar uma interferência na maneira como o Alex da Wave acha melhor trabalhar, até porque confiamos demais na competência do cara em termos de distribuição.
Programa de Rock – Como é a relação da banda com os selos que lançam seus discos?
Airton S – A Pisces foi o primeiro selo em que entramos. O Ulysses é um cara muito gente boa, apesar de meio viajandão (risos). É foda conseguir falar com o cara, por exemplo. Mas o apoio que ele nos deu e continua dando é inestimável. Começamos a nos falar em 2007 e ele sempre se mostrou um cara muito honesto e sobretudo apaixonado pelo que faz. Quando resolvemos mandar o Affects pra Wave, não rolou nenhum tipo de mal-estar, até porque o Alex é quem distribui o Dead Pop, adquirido junto à própria Pisces. Inclusive aproveito pra avisar que esse disco já já vai acabar e quem não adquiriu, falou, um abraço. Não creio que ele vai voltar logo aos catálogos. Já sobre o trabalho com a Wave, sei lá, parece que foi um passo natural fechar com o selo. O Alex atua na cena gótica desde os anos 80, é figura carimbada nos principais eventos internacionais do estilo, tem contatos quentes, enfim, não tinha como não ser do jeito que está sendo. Botamos fé demais no trampo dele, musical inclusive. Eu e o Mazela já éramos fãs do 3 Cold Men antes mesmo de formar o Plastique (risos).
Programa de Rock – Vinil: há algum fetiche em especial da banda por este suporte ? Há alguma demanda dos fãs por lançamentos neste formato do Plastique Noir?
Airton S – Não sei, mas acho que deve existir. Confesso que a gente nunca pensou muito nisso até então. O Rafael, nosso produtor, às vezes bate nessa tecla. James, nosso amigo que toca no Facada, também de vez em quando tenta instigar a gente, falando das vantagens da prensagem em vinil, na questão do volume de cópias… Quem sabe um dia?
Programa de Rock – Como tem sido a divulgação de “Affects” no Brasil e no mundo, há algum plano em em ação neste sentido?
Airton S – Bom, felizmente a demanda por shows tá rolando sem que tenhamos a necessidade de sequer correr atrás deles. Algumas datas fora de Fortaleza foram fechadas e algumas até já foram cumpridas com sucesso. O pessoal parece estar curtindo bastante o disco. O promocional tem sido feito pela gente, por meio de nossa onipresença quase constante nas redes sociais e aqui cabem agradecimentos ao Rafael, em parceria com o Alex, que está colocando o disco nas lojas de São Paulo e da Europa, neste último acaso através da distro alemã Nova Media. O lançamento será em São Paulo também, numa festa do Via Underground. O Alex cuida mais da promoção no meio gótico e a gente está tentando colocar o disco evidente no meio independente nacional em geral, aproveitando os contatos que já fizemos em nossas passagens pelos festivais da Abrafin e eventos do Fora do Eixo.
Programa de Rock – A agenda de shows de vocês, como está? Tenho visto que a banda tem conseguido se inserir na agenda de festivais independentes e, com isto, se apresentado para um público mais amplo. Isto é fruto de um esforço em especial da banda neste sentido ou os convites vieram de forma “espontânea”? Pretendem seguir por este caminho? E como tem sido a recepção do público dos festivais à proposta do Plastique Noir?
Airton S – Olha, é meio que as duas coisas. Por aqui em Fortaleza a gente sempre foi alinhado com o coletivo local, a Rede Cem e daí eles nos servem de ponte pras curadorias. Mas acredito que nosso som acabe agradando, nego não ia pôr uma banda no line-up do festival dele que custou 90 mil pra acontecer, se houvesse o risco de, com a inclusão da tal banda, o negócio ficar feio. E o resultado acaba sendo bacana pros dois lados. A gente tem levado um público pros festivais que dificilmente iria pra ver as outras bandas. Nisso, acabam curtindo algo que não conheciam. E de forma semelhante, a gente acaba fisgando uma ou outra pessoa que estava ali, assistindo, sem botar muita fé na gente. Estamos tentando dar prosseguimento a essa via de trabalho. Esse ano já fizemos o Tendencies, em Palmas, e o resultado foi ótimo, travamos um contato amigável massa com a cena rockabilly de Curitiba por exemplo, que estava lá e de repente pode pintar algo disso…
Programa de Rock – Há uma faixa tributo a um antigo integrante da banda, falecido, no disco. Falem-nos um pouco de quem se tratava e qual foi sua contribuição para a construção da sonoridade do Plastique Noir.
Airton S – O Max integrou a banda desde o seu inicio até a metade de 2008, tendo definido muito de nossa identidade melódica e chegando a gravar o Dead Pop. Ele tocou na banda que pioneirizou esse estilo mais pós-punk gótico em Fortaleza, o Rebel Rockets, nos anos 90. A banda já estava extinta quando o convidamos a assumir os synths no Plastique Noir. O cara cativou todo mundo logo de cara com seu jeito amável de ser, sem falar em sua puta bagagem musical, quase enciclopédica. A chegada dele à formação foi, sem dúvida, o marco final para que nos sentíssemos prontos pra começar, como banda de verdade. Tinha ainda o folclore derivado de sua profissão como agente funerário (risos), era divertido mencionar isso em entrevistas. Infelizmente o cara foi se ocupando demais com atividades paralelas e teve que deixar a banda. Digo, deixou mesmo: ele não foi expulso e também nunca pediu pra sair. Foi estranho… simplesmente ele parou de comparecer a ensaios, shows… daí a gente ia se virando. Hoje, interpretamos essa atitude como uma maneira que ele encontrou de evitar de falar em saída por não querer de fato sair. Nosso contato foi ficando cada vez mais esparso desde então, sempre tínhamos notícias de sua vida por meio de um primo dele que é muito amigo nosso, quase irmão dele. Foi um choque quando recebemos a notícia de seu falecimento devido a complicações de saúde. Ele já estava há muitos dias em coma e o fato ocorreu quando estávamos numa reunião de amigos em razão do aniversário do Mäzela, que acabou sendo atingido de forma violenta naquele que era seu dia. O disco estava para começar a ser gravado, já tínhamos o material inteiro pronto. Somos caras bastante céticos, mas gostamos de pensar que ele estava presente posteriormente no processo, ajudando nem que fosse a partir da idéia que sua pessoa representa nos nossos corações de forma inspiradora.
Programa de Rock – Aproveitando o “gancho”: façam-nos um resumo do que tem sido a experiência da existência da banda até agora: os acontecimentos mais marcantes, as maiores dificuldades, as maiores alegrias …
Airton S – Cara, esse começo da minha resposta vai soar clichê, mas é foda: a gente passou por muita coisa nesses 5 anos. Eu juro que não consigo mais repassar minha vida durante esse tempo dissociando-a da banda. Acho que a melhor coisa que ficou são os amigos. As viagens sempre foram e são cansativas, mas eu diria sem pensar muito que elas são o melhor da festa. E é o que mais marca. E olha que eu não gosto de fazer show, meu lance é estúdio. A gente se divertiu muito por aí. Conhecemos gente de toda parte, vivemos momentos engraçados, encontramos freaks de toda espécie. A parte ruim, acho que foram os desentendimentos. A gente já brigou muito, de vez em quando ainda brigamos, aliás. Já fiquei sem falar com o Mäzela por semanas, já “rompi” até mesmo com o Babuê, que é uma moça (risos). Tivemos momentos em que tínhamos grana pra caramba pra investir nas nossas coisas, situações em que nos sentimos rockstars por causa de bobagens como, sei lá, estarmos pela primeira vez em um puta hotel aguardando a hora do show. Sabe, essa coisa meio de moleque sonhador? “Caralho, fodeu, estamos bombando!” (risos) Meio ridículo até… Ou ainda, estarmos ao lado de bandas gringas fodonas, na mesma van… Encontramos o Afrika Bambaataa no backstage do Abril Pro Rock, uma lenda viva, tocamos na mesma noite, o cara mó figuraça, divertidão, tirando sarro do Mäzela bêbado… Assim como também já rolaram momentos em que estávamos quebrados, sem ter nem o que comer esperando o ônibus de volta pra Fortaleza, bebendo cachaça e tocando violão na rodoviária pra passar o tempo. Já rolou de sermos saudados pessoalmente por jornalistas de certa envergadura e de sermos difamados e acusados levianamente por pseudo-produtor de evento. Sua primeira pergunta foi sobre “gueto”, tem um jornalista que você deve saber a quem me refiro, vive batendo verbalmente na gente… Mas é isso. Tudo faz parte e nós fazemos parte de tudo isso.
Programa de Rock – E para o futuro, há planos, metas ou é navegar ao sabor dos ventos?
Airton S – A gente nunca faz planos a longo prazo. Engraçado estar respondedo a essa entrevista logo agora, porque ontem mesmo eu estava tomando umas cervejas com o Babuê e começamos a retomar os planos pra shows no exterior, mas não convém divulgar nada ainda. O que dá pra adiantar é que já tem coisa concreta a esse respeito, mais detalhes em breve. Vamos tentar fazer as cidades que ainda não fizemos, principalmente na região sul. O norte já começamos a desbravar recentemente em Palmas, mas é a maior região do país, ainda tem muito lugar lá pra se ver e nos ver. Interrompemos quase que totalmente os shows durante os três meses de gravação e produção e agora queremos tocar bastante, o máximo, onde der e em quaisquer condições, desde que não seja muito inviável em termos de aparelhagem e deslocamento. Queremos corrigir algumas falhas nossas, como a escassez de merchandising. Gente de toda parte fica enchendo nosso saco por camisas, bottons, etc, e estão certos em vir encher. Vamos tentar tocar nos festivais em que ainda não tocamos e buscar mais visibilidade no geral, aproveitando que estamos com assunto novo. No caso, o álbum.
Programa de Rock – Espaço aberto para considerações finais.
Airton S – A gente queria agradecer de todo o coração por esse seu espaço e principalmente pela divulgação do trampo de bandas independentes como a nossa, que normalmente tem muita dificuldade pra produzir e circular dignamente. Muito obrigado por preencher essa lacuna preciosa. Somos muito a fim de tocar em Sergipe, quem sabe um dia. Abração pra todos que fazem seu programa e que o acompanham também!
+ em http://plastiquenoir.net
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