Pitty esteve em Londres gravando um especial de TV sobre os 40 anos  da morte de Jimi Hendrix, fez um ousado ensaio para uma revista de  tatuagem e viu uma de suas músicas impedida de entrar na programação de  uma rádio porque outra, dela própria, se recusava a parar de tocar.  Contudo, a cantora vê o espaço para o rock “se estreitar” na grande  mídia – ela foi um dos poucos artistas do gênero a gravar o tema do Rock In Rio, para a próxima edição. Este também foi o ano em que ela e o guitarrista Martin começaram o projeto paralelo Agridoce, distante do rock, e Martin, por sua vez, iniciou outra banda com o baterista Duda. Nada que abale o grupo, Pitty garante.
Nessa super entrevista concedida ao jornalista Marcos Bragatto e feita aos poucos via internet, a cantora  também fala de jabá (sim, ainda existe), do dilema que vive quanto à  formação intelectual dos fãs, das agruras de ser famoso e usar as  ferramentas da internet (tem blog, twitter e facebook), além de  espinafrar a falta de conteúdo das bandas mais novas. Confira abaixo  todos os detalhes e prepare-se, porque o sabadão promete!
Fonte: Rock Em Geral
Rock em Geral: Vocês vão gravar um novo DVD, dessa vez no  Circo Voador. O que esse vídeo vai ter de diferente se compararmos com  os demais?
Pitty: Tudo. Outro tipo de edição e linguagem, a  banda diferente por conta do tempo de estrada. É um show com repertório  bem distinto do anterior. Inclusive, a idéia é não regravar nenhuma  música que já havia entrado no “{Des}Concerto”.  A idéia de fazer no Circo é antiga, nossos shows por lá sempre pegam  fogo e eu queria um DVD que captasse essa vibe mais roots, mais show de  rock mesmo, simples e sem firulas. O Circo Voador me pareceu o lugar  ideal para isto, além de ser um lugar emblemático para o rock nacional  traz no próprio nome uma “ludicidade” que me agrada muito.
REG: O lançamento será quando? Em quais formatos? O áudio sai em vinil também?
Pitty: A previsão é para março ou abril. Vai sair em  DVD, Blu-ray e acredito que também em CD. Não conversamos ainda sobre  sair em vinil, mas é possível. Por mim sai em todos os formatos, para  cada um aproveitar do jeito que lhe convier.
REG: Sua carreira tem se pautado pelo lançamento de muitos  vídeos. É uma iniciativa artística ou a necessidade de ter aquilo que o  mercado consome (DVD)?
Pitty: Em relação ao “padrão” acho até que lançamos poucos DVDs. Em sete anos de carreira, de show ao vivo só tem o “{Des}Concerto”.  Não fizemos DVD ao vivo de todos os discos, os outros que temos são  documentários. O “Admirável Vídeo Novo” engloba uma parte da cena  alternativa baiana e versões em estúdio tocando com alguns convidados; o  “Chiaroscope” é um making of do disco só que sem depoimentos, é mais  vídeo-arte e experimentalismo visual. São três ao todo, em sete anos, e  agora serão quatro. Não tenho noção se isso é muito ou pouco, mas esses  foram os que a gente teve vontade de fazer até hoje. Tem banda que mal  lança disco de estreia e já vem com DVD ao vivo, né? É isso, acho que o  público curte DVD. Eu também curto, mas não forço a barra na hora de  fazer nem fico inventando motivo. Pinta uma idéia que a gente acha  bacana, a gente vai lá e faz.
REG: O repertório já foi definido? O que você pode nos adiantar?
Pitty: O set list é baseado no “Chiaroscuro”,  com alguns lado B do primeiro disco e uma inédita - até agora. Dessa  vez tem participações especiais também, coisa que não rolou no anterior:  Hique Gomes, do Tangos e Tragédias em “Água Contida”, e Fábio  Cascadura, numa parceria nossa chamada “Sob O Sol”. A grande novidade  pra gente foi trazer um tecladista (o Bruno Cunha, do Caixa Preta) para  este projeto. É uma experiência que eu sempre tive vontade de fazer,  muitas bandas que eu adoro usam isso com maestria e o som fica mais  cheio e complexo. Morria de curiosidade de saber como ficariam as  músicas, às vezes com um Hammond fazendo a cama, às vezes com  barulhinhos lisérgicos de Mini Moog, e tantas outras possibilidades.  Essa foi uma descoberta que veio com o “Chiaroscuro”,  quando dobramos alguns riffs de guitarra com sintetizador e vimos que  resultava num timbre foda, ou quando adicionávamos um piano staccato  numa parte mais rápida e aquilo fazia a canção “andar”. Quando se fala  em teclado percebo que alguns ainda têm uma idéia estereotipada da  coisa; mas o instrumento pode ser usado como camada subliminar, às vezes  quase imperceptível e adicionando uma textura nova e muito interessante  aos ouvidos. O resultado nos ensaios tem sido sensacional e a gente  está amarradão.
REG: Faz mais ou menos um ano que o “Chiaroscuro”, foi lançado. Com esse distanciamento, do ponto de vista artístico, como você avalia a sequência dos três discos?
Pitty: Talvez ainda seja cedo para englobar apenas  três discos nessa comparação que vou fazer agora, mas é como se fossem  três fases de uma vida. O primeiro é a infância: inocente, puro,  aprendiz e cheio de vontade. O segundo é a adolescência: urgente,  auto-afirmativo, enérgico, querendo se descobrir. E o terceiro seria a  vida adulta: um prenúncio da maturidade. Cheio de questionamentos  subjetivos, menos literal, mais misterioso e mais complexo,  emocionalmente. É a tranquilidade de ser mais do que querer mostrar que  é, aquela estranha calma turbulenta que se adquire com a idade.
REG: Em termos de vendas e exposição, o “Chiaroscuro” manteve o desempenho dos anteriores?
Pitty: Os tempos são outros, e nós também somos outros. Guardando as proporções de mercado ao longo desse tempo, o “Chiaroscuro”  tem se saído melhor que a encomenda. Não é um disco exatamente “fácil”.  Apesar de ter canções bem melódicas, se faz necessário uma audição mais  atenta. A sonoridade dele é introspectiva, nada está “de bandeja”, tem  muita coisa a ser descoberta ali. As letras exigem uma atenção maior,  sempre há uma entrelinha. E o público mais jovem tende a absorver mais  rapidamente coisas mais palatáveis, especialmente nesses tempos de  coisas bem facinhas. A melhor coisa do “Chiaroscuro”  foi ter trazido para perto uma galera mais velha e com referências mais  parecidas com as nossas, além de ter mantido os que cresceram desde o  nosso primeiro disco e continuam se identificando. Vender disco já nem é  de fato um objetivo, é um milagre. Sobre exposição, a grande mídia  também mudou de lá pra cá. O espaço para rock (rock mesmo, digo) se  estreitou. Mas é sempre um ciclo. Isso tudo é periférico, e não deve  influenciar na decisão de se fazer um disco assim ou assado. Para mim  mais vale esperar o mundo girar a meu favor do que, a cada nova estação,  adquirir uma camuflagem para caber na situação. O que sei é que dos  três, o “Chiaroscuro” é o que tenho mais orgulho.
REG: Você disse que não consegue colocar uma nova música nas rádios porque “Me Adora” continua tocando. Por que isso acontece?
Pitty: As rádios têm um número limitado de músicas  nacionais a serem tocadas, bem menor que o espaço reservado para as  músicas gringas. Isso porque (e eles comprovam em Ibopes e afins)  artistas internacionais na programação dão mais audiência. Bom, foi o  que eu soube. E aí que “Me Adora” - que de início sofreu uma boa  resistência para ser tocada - começou em uma rádio que primeiro abriu o  espaço, ganhou força, passou para as outras e não saiu mais das paradas.  Continuava entre as mais pedidas mais um ano depois do lançamento, o  que me deixa muito lisonjeada. Só que já precisávamos vir com coisa  nova, e não é possível ter duas músicas da mesma banda nesse espaço já  restrito de programação nacional, além da questão de “Fracasso” ter umas  guitarras mais roncantes coisa e tal. Ou a letra, sei lá. Vou te falar  que isso tudo sou eu tentando entender, porque no final das contas acho  que se tivéssemos feito versões acústicas tinha tocado qualquer uma. Mas  a coisa anda tão sinistra que eu soube de gente que não tocou  “Fracasso” sob a alegação “não toco uma música com esse título na minha  rádio”. Cada um com sua loucura, né?
REG: Você é um dos poucos artistas que são “trabalhados” nos  moldes antigos, com pagamento de jabá às rádios e TVs. Você acha que  isso ainda funciona?
Pitty: Não é bem assim. Sou de uma gravadora  independente que não conta com rios de dinheiro, especialmente em tempos  de crise. Nunca soube de jabá em TV - ao menos pra mim, não sei como  funciona para os outros. Nas rádios o que sei é de alguns shows  promocionais, sem cachê. Isso é tranquilo, porque estou tocando para  divulgar o meu som, isso não me incomoda. Ou de promoções com os  ouvintes, o que também não me incomoda nem um pouco. Se fosse  simplesmente pagar para tocar, teoricamente eu não teria preocupação com  singles mais pesados, e não é o que acontece. Cada rádio tem o seu  perfil, e a coisa é que não existe mais rádio exclusivamente de rock no  Brasil. Rádio grande, digo. Aí fica tudo misturado, padronizado. É ter  banda de rock competindo com r&b e pop, que por ter um público  maior, naturalmente ganha mais espaço. E o rock fica ali espremido,  tímido, tendo que se enquadrar nesse padrão médio para não destoar  dentro da programação. Eu já dou murro em ponta de faca demais, isso  cansa. E o pior é ficar de “lobo da estepe” na situação, sem nenhum  artista ou banda para fazer coro a essas questões. Mas tocar em rádio  ainda funciona, e muito, se você quer atingir um público mais massivo.  Nem todo mundo tem internet banda larga em casa. Se interessar, até  escrevi sobre isso uma vez: www.pitty.com.br/blog.php?id=182
REG: Recentemente você começou um novo projeto, Agridoce, como o guitarrista Martin, bem diferente do que você faz e distante do rock. O que pretende com ele?
Pitty: Exercitar outros lados, tocar piano, aprender  a gravar em casa. Laboratório, experimentações. E botar pra fora essa  parte mais introspectiva e melancólica que às vezes aparece nas minhas  composições. Brincar com outra sonoridade, outro clima. Aproveitar meu  tempo de forma criativa. Isso tudo era pretendido desde o começo; nada  era no quesito “trabalho”. A coisa começou a chamar atenção e pessoas  escreveram e se interessaram por isso, e aí pintou convite pra disco,  show. Mas por enquanto, sei lá, a gente só quer fazer mesmo.
REG: O Martin e o Duda também têm outro projeto. Vocês estão  cansados de fazer o que fazem ou faz parte tocar algo diferente de vez  em quando?
Pitty: Não é cansaço; é muita energia criativa e uma  enorme inquietude e curiosidade. Considero isso algo bom. Dá uma  renovada, especialmente benéfica para a nossa banda principal. Projeto  paralelo é pra isso, pra você gastar outros lados e experimentar novas  possibilidades. No meio do ano, por conta de Copa do Mundo e eleições os  shows deram uma diminuída. E aí, eu ia ficar fazendo tricô? Fomos ouvir  som e fazer música.
REG: Você continua fazendo muitos shows? Tem idéia de quantos faz por ano e o número de cidades?
Pitty: Esse ano foi bem estranho, como eu falei. Pra  todo mundo foi assim, todas as bandas sentiram. No fim do ano deu uma  embalada boa, mas não sei de números. A média é de dois por fim de  semana. Nos primeiros anos de banda fazíamos - sei lá - uns duzentos  shows por ano. Hoje, sete anos depois, acho mais importante priorizar a  qualidade do que a quantidade. Menos e melhores shows, em melhores  circunstâncias. E assim ter tempo para outras atividades criativas.
REG: Depois de três discos bem sucedidos já deu pra comprar  muita coisa com o dinheiro que você ganhou? Já dá para parar de  trabalhar e só curtir a vida?
Pitty: Mas fazer o que eu faço é que é curtir a  vida. Não sei o que seria curtição maior senão isso. Com a grana desses  anos pude finalmente ter uma casa, um cantinho pra chamar de meu, isso é  o mais precioso de tudo. Morria de medo de, literalmente, não ter onde  cair morta. No mais, não tenho grandes sonhos de consumo. Não economizo  com discos e livros e filmes, mas morro de pena de gastar com sapato ou  roupa, por exemplo. O que considero luxo hoje com a grana que ganhei é  poder viajar para festivais gringos e ver bandas fodonas. Me comprometi  comigo mesma de uma vez por ano me dar esse presente.
REG: Você já parou para pensar sobre que tipo de público tem  formado? A julgar pelos comentários deixados aqui no site, em matérias  com você, em geral são pessoas muito novas, que mal conseguem se  expressar ou fazer alguma observação interessante. Isso te incomoda?
Pitty: Eu vivo num eterno conflito em relação a  isso. Por um lado, esse é o reflexo de ter atingido um grande público,  heterogêneo, de várias classes sociais, idades e níveis intelectuais.  Isso é, talvez, o “povo”. Por vezes não captam nem entendem todas as  minhas referências, nunca ouviram falar dos livros que li ou das bandas  que gosto, mas de alguma forma se identificam com meu som. Isso é bom na  medida em que talvez a banda sirva de porta de entrada. Alguns desses  podem se interessar e serem fisgados para estes assuntos. O lado  cansativo é ter que agir didaticamente ou ser tido como um alienígena.  Muitas vezes encontro pessoas que dizem gostar do meu som, mas que não  têm absolutamente nada a ver comigo. E quando encontro gente que saca do  que eu tô falando, é um presente sem tamanho. Tem outra coisa também: o  rock no Brasil é extremamente infantilizado, em todas as frentes. Os  adultos que curtem rock no Brasil acabam buscando lá fora suas  referências e tem uma tendência enorme de desprezar as bandas  brasileiras justamente porque aqui, para uma banda se divulgar em larga  escala, ela precisa estar numa mídia mais popular ou voltada para os  teens. Os adultos roqueiros do Brasil estão um tanto órfãos de boas  publicações e canais de TV voltados para o estilo. O rock brasileiro  acaba tido como “coisa de criança” e cria-se um enorme preconceito em  relação às bandas porque estão todas juntas no mesmo saco - as legais e  as bobinhas. Conheço muita gente que curte meu som, mas tem vergonha de  dizer diante dos amigos porque admitir que gosta de uma banda brasileira  famosa é pejorativo. As independentes tudo bem, é “cool”. Claro que  existem sites, publicações e programas mais alternativos que dão conta  do recado, mas atingem apenas aquela parte das pessoas que busca a  informação de forma mais direcionada. E aí o que acontece é que a gente  lida com uma galera mais popular e suas limitações, isso inibe uma  galera com referências mais profundas de chegar perto “porque eu não  posso gostar da mesma coisa que essas pessoas gostam”, e vira esse ciclo  vicioso maluco. Os comentários no site talvez sejam o reflexo disso  tudo, e para se pagar as contas confortavelmente com rock no Brasil é  necessário atingir muita gente e sair do gueto. Eis aí o dilema.
REG: Você participou do clipe de lançamento do Rock In Rio, e era quase solitária como artista de rock. Como você vê isso?
Pitty: Tranquilamente, tenho consciência de que esse é o perfil do Rock in Rio.  Desde o começo sempre teve artistas de outros estilos. Se não me engano  Elba Ramalho, Ivan Lins e Moraes Moreira estiveram na primeira edição.  Mas tem as grandes bandas de rock gringas também, e tocar num festival  desse porte é sempre uma coisa sensacional para qualquer artista.
REG: Como artista grande, você deve se encontrar todo momento  (em festivais, programas de TV e eventos) com artistas do mainstream  que fazem música de gosto duvidoso - para dizer o mínimo. Como fazer  para conviver com essas pessoas?
Pitty: Com civilidade e respeito. Cada um tem  direito de fazer o que quer e eu não tenho obrigação de gostar, mas  tenho obrigação de ser um ser humano civilizado e saber conviver com as  diferenças. Não preciso dar tapinhas nas costas, apenas ser educada e  cortês. Posso tranquilamente me dar bem com determinado artista no nível  pessoal e não ter o disco dele em casa.
REG: Como você vê o novo chamado novo rock “teen” nacional?
Pitty: Não sei exatamente o que se enquadra nessa  categoria ou não. Falam muito dessa coisa do “colorido”, mas,  sinceramente, isso é o que menos importa. Não tô nem aí se é colorido,  preto e branco ou incolor. Para mim vale a essência e a profundidade da  coisa. E por isso, generalizando, vejo uma triste falta de conteúdo.  Parecem não prezar pelo aprimoramento da linguagem, da escrita, do  questionamento. Nem tô falando de ser panfletário ou algo do tipo, é  possível falar sobre coisas leves com um vocabulário mais interessante. A  questão é a falta de aprofundamento sobre qualquer assunto. É a  superficialidade, a bobice, a falta de “culhão”. Por exemplo, vejo  dizerem que o assunto “amor” é o vilão da história, que as bandas só  falam disso e etc. E aí me lembro de grandes figuras como Cartola, Noel  Rosa ou Morrissey  que conseguiram falar de amor com poesia e sensibilidade, abordando  lados menos óbvios, e vejo que a culpa não é do assunto. Talvez falte  vivência, mesmo. Vejo também uma valorização exacerbada da imagem em  detrimento da mensagem. Sou a favor da estética se ela serve pra  endossar e comunicar uma idéia. Mas se não há idéia, a imagem é apenas  uma embalagem bonita e oca. Um livro de capa deslumbrante e páginas em  branco. Falta coragem para falar sobre as coisas nem sempre tão corretas  que a gente sente; falta veneno, passionalidade, visceralidade, curva,  malícia. Senão fica tudo muito morno e ajeitadinho, bonzinho e  bonitinho. E sinto que o rock não nasceu para ser “inho”. O rock é “ão”.
REG: Sobre um novo disco, alguma coisa já agendada?
Pitty: Penso em fazê-lo ano que vem, ainda não sei  quando, nem como, nem o quê. Tenho alguns embriões de idéia por aqui,  mas vou deixar isso amadurecer no tempo certo. Um projeto de cada vez, e  agora é hora de clipe novo e DVD.
REG: Imagino que o que você ouve hoje seja diferente daquilo  que ouvia antes da fama. Isso muda na hora e definir que tipo de som vai  fazer?
Pitty: Na real é diferente não por questão da fama,  mas sim da passagem do tempo e do conhecimento de coisas novas. O que eu  ouço hoje não anula o que eu ouvia antes, mas soma. Na hora de fazer  som tudo aparece muito mesclado, os de hoje e os de ontem.
REG: O que você tem ouvido? Quais bandas têm te impressionado ultimamente, ao vivo?
Pitty: De mais recente que me chapou foi o  Grinderman, banda do Nick Cave. Fiquei um tempo obcecada com o disco  “Friendly Fire”, do Sean Lennon, mas já melhorei. O novo da Imelda May é  massa, o Arctic Monkeys não é tão novo, mas não sai do meu play list. Curto muito a onda “Joy Division” do She Wants Revenge também. De shows, ver o Queens of The Stone Age e o Mars Volta no SWU me deixou abalada emocionalmente, especialmente o QOTSA. Absurdo como os caras são bons no palco.
REG: Você usa as ferramentas da internet com frequência, mas,  outro dia, no twitter, te sugeriram para ser adicionada, foram reclamar  com você e você protestou. Como vê essa relação artista na web x mundo  real?
Pitty: Não lembro desse caso especificamente, mas  volta e meia fico de saco cheio quando aparece gente sem noção. É  impressionante como algumas pessoas não entenderam a finalidade da  ferramenta e te cobram coisas absurdas. Ou mandam duzentas vezes  mensagens irrelevantes de “me segue”, “me dá um oi” e criancices desse  tipo. Pra quê seguir gente que eu não conheço se mal tenho tempo para  ler os dos meus conhecidos? Nem consigo adicionar todos os amigos que  quero. Teria que passar a vida na frente do computador, e ainda assim  não daria conta, e ainda assim teria alguém reclamando “que não dá  atenção”. Talvez a culpa seja dessa relação nociva de vassalagem que se  estabeleceu entre banda e público, esse toma lá dá cá. “Goste de mim  porque te mando beijo, digo que te amo, supro sua carência afetiva”.  Acho perigoso esse paternalismo porque o que realmente importa, que é a  música, acaba ficando sempre em segundo plano. Tem gente que aposta  nisso como moeda de troca, se utilizando dessa carência para barganhar  mais votos em prêmios ou coisas assim. Não quero que gostem de mim por  causa disso, quero que gostem porque minha música os diz alguma coisa,  porque se sentem tocados profundamente por ela. Eu não tenho nada a  oferecer que não sejam minhas canções e minha própria confusão enquanto  ser vivo - também em forma de arte. Se isso os alimenta, ótimo, me sinto  recompensada. Se não, é hora de questionar se estão ali pela música ou  pelo oba-oba. Ainda assim, a internet é um ótimo lugar pra dividir  idéias e aprender coisas, e nesse caminho já conheci muita gente que  valeu a pena e me acrescentou muito, portanto, valorizo bastante esse  meio de comunicação.
REG: Você também sempre atualiza o seu blog e, no twitter, se  intitula como “escrevedora”. Essa é uma vocação deixa de lado pela  carreira artística ou as duas coisas caminham juntas?
Pitty: As duas coisas caminham muito juntas. Mas eu  escrevo compulsivamente e obsessivamente, e preciso de mais lugares para  escoar esses escritos além das letras de músicas, por isso o blog. Um  dia, se eu tomar coragem, quem sabe faço um livro de crônicas.
REG: Você passou uma temporada em Londres recentemente, num trabalho envolvendo as homenagens aos 40 anos da morte de Jimi Hendrix. Explica como foi esse trabalho?
Pitty: Me chamaram para apresentar um documentário  sobre os 40 anos da morte de Hendrix feito em Londres, passando por  lugares emblemáticos da carreira dele. Aconteceram eventos especiais na  cidade por conta disso, a casa dele foi aberta à visitação, com  memorabília rara e tudo o mais. Foi sensacional a experiência, aprendi  muito. Além disso, teve uma “Rock Tour”, visitando lugares importantes  para o rock inglês e ouvindo as histórias das bandas. Conheci o Rainbow  Theater, lugar de shows históricos onde, por exemplo, o Pink Floyd tocou  o “Dark Side of the Moon” pela primeira vez. Hendrix incendiando a  guitarra entrou pra história por causa do (Festival de)  Monterey, mas em Londres eu descobri que poucos meses antes do Festival  ele havia “testado” essa performance no Rainbow. Trabalhei, mas também  me diverti a valer. Turismo etílico nas centenas de pubs, Camden Town e  seus vinis, e aventuras por inferninhos do submundo londrino.
REG: Uma vez te perguntei sobre posar nua para uma revista  masculina e você disse que não, que isso é uma “banalização da mulher”.  No entanto, para uma revista de tatuagens, você mostrou muito mais do  que se esperava. Mudou de idéia nessa questão? 
Pitty: Claro que não. A diferença está na linguagem e  no veículo. Ali era uma revista de tatuagem e comportamento, com  matérias bacanas e textos que vão além da coisa da “mulher pelada”. O  corpo ali é só mais uma coisa dentro de um todo. O público também é  diferente, são outros valores. Meu problema nunca foi o pudor, por mim  vivia todo mundo nu. O problema é a mente pequena, é querer a mulher de  perna aberta desde que esteja de boca fechada.

Nenhum comentário:
Postar um comentário