quinta-feira, 18 de junho de 2015

KARNE KRUA

Karne Krua, a mais importante banda de rock de Sergipe, começou há exatos 30 anos, no início de 1985, na cidade de Aracaju. É, muito provavelmente – quase que certamente - a mais antiga banda de punk rock em atividade na região nordeste do Brasil. Em atividade ininterrupta! É muito comum que bandas de rock “underground” se formem, marquem uma época – ou não – e então sucumbam às dificuldades e interrompam suas atividades, pelo menos por um tempo. Às vezes por um longo período. Isso não aconteceu com a Karne Krua: eles nunca pararam! Houve uma grande rotatividade de membros, ao ponto de existir, na formação atual, apenas um componente egresso do “line up” original: Silvio Campos. Que já era inquieto e montava bandas – The Merda´s (com Helder “podre”, o DJ Dolores), Sem Freio na língua – desde o final da década de 1970. Ainda hoje, incansável, toca diversos projetos ao mesmo tempo, indo do blues da Máquina Blues ao “grindcore” da Logorréia.  

Dificuldades não faltaram: nos primórdios, eles eram vigiados de perto por camburões da polícia ao saírem nas ruas com seu visual agressivo, especialmente para uma capital provinciana, num país recém-saído de uma ditara militar brutal. As oportunidades de se apresentar eram raríssimas, e geralmente esbarravam na falta de equipamentos e de estrutura. Mesmo assim, gravaram fitas “demo” (de “demonstração”, não é o que você provavelmente está pensando) caseiras e as espalharam por todo o Brasil, criando uma verdadeira lenda em torno de seu nome. Raramente foram muito longe, em termos estritamente geográficos – uma apresentação em Brasília há cerca de 5 anos é o máximo que consigo lembrar – mas estão sempre se apresentando por aqui e pelas cidades e estados vizinhos. Na maioria organizando, eles mesmos, os seus próprios eventos e shows, na melhor tradição punk que legou ao mundo a cultura DIY, de DO IT YOURSELF – Faça você mesmo!

Em 1994 conseguiram lançar, finalmente, seu primeiro disco, ainda em vinil. Karne Krua, o álbum, foi gravado no Recife devido à escassez de estúdios na cidade. Produzido e distribuído de forma absolutamente independente, teve uma repercussão morna: o repertório era impecável, maturado ao longo dos anos e com verdadeiros clássicos do cancioneiro roqueiro local, mas a produção musical deixou muito a desejar e a época, com todos ainda muito empolgados com a transição para as mídias digitais, então em ascensão, não ajudou. Hoje é item de colecionador ...

Seguiram trocando de formação e lançando demos até que, no início do novo século, conseguiram colocar na praça, desta vez com a ajuda do poder público, via lei de incentivo – municipal – o primeiro CD, “Em Carne Viva”. O lançamento do disco foi histórico, com um show lotado no espaço EMES que comprovou a incrível capacidade da banda de renovar seu público.

O maior triunfo, no entanto, ainda estava por vir: o álbum “Inanição”, uma verdadeira obra-prima do gênero em terras brasilis. Gravado num momento de transição, ainda com o grande baterista Thiago “Babalu”, que se mudou para São Paulo e hoje toca com Deus e o mundo por lá, e Alexandre, o guitarrista, fazendo também o papel de baixista, demorou uma eternidade para ser lançado. Só veio ao mundo em 2012, exatos dez anos depois do segundo. Mas valeu a pena a espera: trata-se de uma impecável coleção de canções que, alinhadas, traçam um impressionante painel de angustia e revolta diante das injustiças do mundo, do drama dos retirantes ao sofrimento dos animais usados em testes de laboratório. E tem, pelo menos, um novo clássico: a música título, “inanição”. Nele a banda consegue finalmente registrar todo o potencial que, até então, só se revelava em toda a sua plenitude em cima do palco. É um registro que não pode faltar na coleção de ninguém que se diga apreciador do combativo e altivo punk rock nacional.

Hoje, 30 anos depois do começo de tudo, lá no Conjunto Bugio, a Karne Krua volta às origens com um som mais cru, urbano, “Hard Core”, virando a página das influências que moldaram sua personalidade ao longo do tempo – notadamente os “aboios” sertanejos e, paradoxalmente, o chamado “som de Nova York”, difundido por nomes como Biohazard e Agnostic Front – para fechar um ciclo e tomar impulso para novas jornadas. Voltaram, inclusive, ao vinil: lançaram, no ano passado, um EP de 7 polegadas – mais conhecido em outras eras como “compacto” – em parceria com a banda brasiliense “Besthoven”. E agora, em 2015, trazem ao mundo seu novo álbum de inéditas, “Bem Vindos ao Fim do mundo” ...

Trata-se de um LP (Long Play) de vinil lançado em conjunto por 11 selos independentes e pelo programa de rock (19H, todo sábado,  104,9 FM em Aracaju e região) emoldurado por um belíssimo trabalho gráfico assinado pelo guitarrista Alexandre Gandhi (capa) e pelo baixista Ivo Delmondes (layout). Desta vez foi inteiramente produzido em sua cidade natal. Pela própria banda, “with a little help from her friends”. São 18 faixas talhadas a ferro e fogo na energia primal da música feita com a alma e as vísceras expostas. Ainda em carne viva, e sem concessões. Sempre!

Em Aracaju, o disco pode ser encontrado na “Freedom”, que fica na Rua Santa Luzia, 151, próximo à Catedral Metropolitana. Vá lá, compre o disco e troque uma idéia com Silvio, o vocalista. É dele, a loja.

Um verdadeiro Herói da resistência.

por Adelvan k.

fdp

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